Gestão é uma palavra ampla, complexa e que pode ser percebida por diferentes perspectivas. No caso dos empreendimentos rurais, “a necessidade de buscar sinergia entre as atividades que são praticadas desde a propriedade rural até os consumidores finais, exigem do administrador rural o conhecimento profundo para que efetive a tomada de decisão adequada. ” (Grehs e Baumhardt, 2017)[1]. Por conseguinte, a atenção a aspectos tanto estruturais quanto conjunturais deve guiar a atenção ao empresário e, ainda mais particularmente, no caso daquelas propriedades cujo tamanho[2], dimensão e suscetibilidade, concedem pouca margem de reconfiguração.
Esse é, aliás, um aspecto importante a ser considerado. Em muitas situações associa-se, equivocadamente, propriedades maiores ou mais pujantes como necessariamente mais eficientes, bem geridas e sustentáveis. Isso não é verdade. A pequena propriedade pode ser – e o é, em muitos dos casos – capaz de possuir uma gestão assertiva e eficiente, focada em processos sustentáveis, na visão adequada de mercado e em tomadas de decisão conscientes e balizadas em informação de qualidade. Para isso, entretanto, é importante que o empresário rural reconheça a importância das boas práticas de gestão e, também, das ações coordenadas, seja em redes associativas ou cooperadas, seja na construção de parcerias de menor custo de transação.
É interessante observar, nesse sentido, que, apesar de existirem especificidades relacionadas ao tamanho das propriedades, seu perfil de gestão ou mesmo o setor de atividade, há aspectos em comum no direcionamento do agro, que, se bem compreendidas, podem favorecer a compreensão do mercado no qual se está inserido, ampliando as chances de sucesso ou antecipando ações que favorecem o acesso a mercados novos e, ou, mais rentáveis. De fato, muitas ‘ondas’ ou formas de concentração de interesse e pesquisa permearam a compreensão e o direcionamento da gestão das propriedades do agro, em termos de indicação de relevância e da concentração de esforços[3]. Nessa análise, o direcionamento principal de cada uma dessas ‘ondas’ não cancela a importância dos demais segmentos, mas destaca onde se encontram ensejo principal de atenção.
A primeira dessas ondas direcionou-se para a produção em si, ou seja, os esforços concentravam-se no produtor e na produção, no que ocorria dentro da propriedade rural. Na sequência, a segunda deslocou o foco para a indústria, para o processamento e a ampliação da diversidade de usos associados aos produtos básicos. A ‘terceira onda’, mais recente, caminhou em direção à distribuição, principalmente o varejo, com o fortalecimento das grandes redes e no destaque ao papel do consumidor. A ‘quarta onda’, cujos contornos estão se tornando cada vez mais evidenciados, se assenta em três princípios básicos: (a) na importância dos contratos e integração vertical (ou seja, destaca o poder associado à coordenação do agro), (b) na formação de parcerias para a agregação de valor e, (c) no uso de tecnologias (de produção, de processo e de informação), orientadas para o mercado.
Essa nova visão incorpora aspectos integrados de coordenação de cadeias produtivas e exige, de todos os atores envolvidos, a compreensão de que ‘azem parte de algo maior, mais complexo que as já desafiadoras atividades que desenvolvem e que, portanto, cada ação individual pesa no sucesso coletivo. Mais que gerir com base nas práticas tradicionais que olham ‘para dentro’ das propriedades – práticas essas sempre importantes -, a participação consciente em ações coordenadas de participação múltipla, a atenção aos detalhes e à qualidade de processos e produtos, o zelo às questões sociais e ambientais, passam a ser fundamentais na gestão das propriedades rurais. Mais desafiador? Certamente. Mas igualmente mais positivo, já que cria redes, conecta pessoas a ações, amplia o conhecimento e o fluxo de informações e, acima de tudo, estabelece compromissos entre as partes de um grande sistema, o agronegócio brasileiro em suas diferentes cadeias de produção.
Viviani Silva Lirio é professora Titular do Departamento de Economia Rural (DER) da Universidade Federal de Viçosa (UFV).
[1] GREHS, Humberto e BAUMHARDT, Jorge Alberto. Gestão sustentável da pequena propriedade rural. 2017. https://domalberto.edu.br/wp-content/uploads/sites/4/2017/11/GEST%C3%83O-SUSTENT%C3%81VEL-DA-PEQUENA-PROPRIEDADE-RURAL.pdf
[2] Tamanho e dimensão não dizem respeito apenas à extensão territorial ou classificação. Há parâmetros técnicos e econômicos que são utilizados para estas classificações.
[3] Uma apresentação didática de muitos aspectos da gestão em pequenas propriedades, e particularmente na itemização das ‘ondas’ do agronegócio, pode ser encontrada no documento a seguir: QUEIROZ, Rodrigo Souza. Gestão da Pequena Propriedade Rural. / NT Editora. Brasília: 2014. 85p. https://www.bibliotecaagptea.org.br/agricultura/agricultura_geral/livros/GESTAO%20DE%20PEQUENA%20PROPRIEDADE%20RURAL.pdf